domingo, 5 de dezembro de 2010

Os inimigos são outros, muitos outros...


Confesso que fui assistir ao filme Tropa de Elite 2 meio a contragosto. Tinha muito receio do esquema simplificador que reduziu o primeiro filme a uma tola brincadeirinha de polícia e ladrão, com direito ao maniqueísmo mais raso que segregava os incorruptíveis soldados do BOPE de um lado, e os bandidos-que-deveriam-mesmo-morrer do outro. Assustou-me ver e ouvir pessoas aplaudindo os balaços que espalhavam massa encefálica a ponto de respingar no espectador. Lembro-me dos versos de Drummond:

“Há no país uma legenda,
que ladrão se mata com tiro”


É possível perceber um desejo de crítica no Primeiro Tropa de Elite (os “burgueses”, a passeata, o roteiro da droga etc). Essas questões, no entanto, são quase que apagadas ou neutralizadas diante de peripécias de segunda ordem que compõem o corpo do filme. Para minha felicidade, o segundo filme chega a quase anular o anterior. Sua construção, do roteiro à qualidade das imagens, traz intrínseco o desejo de perturbar, de derrocar estruturas e, sobretudo, de complexificar problemas tão graves quantos esses que assolam todo o país. Eis o meu maior elogio ao filme: a sua capacidade de querer aprofundar o debate, de demonstrar que o crime no Brasil é uma questão que envolve todos – desde o traficante ao policial, que algumas vezes se confundem, passando pelos governantes, e principalmente por conseguir fazê-lo de forma asfixiante, angustiada, pessimista.

Sim, porque acredito que o pessimismo é importante e mesmo necessário em alguns momentos da vida. É preciso se sentir encalacrado, sem saída, como o José drummondiano, para perseguir formas de enfrentamento. Acredito que Topa de Elite 2 vale a pena por isso. Precisamos discutir o crime sem os vícios deterministas que enxergam apenas desvios de caráter. Há que se questionar sobre quem ajuda a produzir diariamente os bandidos e marginais, categorias que não necessariamente dizem a mesma coisa; sobre o papel da polícia, sobre educação, qualidade de vida, emprego e salário dignos, pontos elementares para se pensar na integridade do sujeito, para que os discursos humanitários não sejam confundidos com mera verborragia para encobrir bandido. É necessário oferecer condições reais para que o homem seja íntegro. E isso só se faz enxergando os problemas de forma sistêmica, compreendendo que “é preciso toda uma tribo para salvar uma criança.” É uma pena que no Brasil a consciência sempre venha acompanhada do mal-estar. É isso!

3 comentários:

  1. Juro que passei por aqui só pra ver se tinha algo novo, e aí vi que era sobre Tropa de Elite 2, que queria ouvir opniões sobre e me deti ao texto, mas sem esperanças de conseguir fazer um comentário decente, mas aí essa frase me fisgou "É uma pena que no Brasil a consciência sempre venha acompanhada do mal-estar."
    É uma constatação genial. É exatamente isso, as pessoas se incomodam, mas não agem. A frustação chega antes do ato.


    Beijos
    :*

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  2. Amigo, eu li! não consigo (ainda) debater sobre o assunto tão "belamente" como vc! rs :) inté!

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  3. Vc foi direto ao ponto assim como o filme, parabéns ao belo texto e vamos continuar usando nossas armas para defender o que acreditamos...Parabéns

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